Guilherme Coutinho entrevista o embaixador Cubano em Brasília |
No último dia 10, o presidente
Donald Trump renovou por mais um ano a “Lei de Comércio com o Inimigo”, um
documento de 1917, que constitui os princípios da relação imperialista dos EUA
em relação à ilha caribenha, demonstrando pouco interesse em mudar a situação.
Foi através desse ato normativo, que o então presidente americano John Kennedy
se utilizou para impor o bloqueio econômico, em 1962, quando o mundo polarizado
vivia o auge da Guerra Fria. Trump vem sistematicamente endurecendo as sanções
a Cuba, desfazendo rapidamente os avanços na relação entre os dois países,
ocorridos no governo de Barack Obama.
Entre os retrocessos da gestão
Trump se destaca a proibição a cidadãos e empresas americanas de realizar
transações ou negócios com entidades vinculadas ao estamento militar cubano,
entre as quais figuram dezenas de hotéis e empresas cubanas. Muitos bancos, de
várias nacionalidades, em todo mundo, encerraram as transações com empresas
cubanas, no início de 2018, por causa da medida. Uma política de restrição ao
turismo norte-americano em Cuba, também assinada por Trump gerou uma queda de
43 por cento no número de visitantes americanos à ilha, no primeiro trimestre
de 2018.
O embargo americano causa todos
os anos um prejuízo financeiro na casa dos bilhões de dólares e é considerado
como o maior impedimento para o avanço social cubano, que mesmo sendo
refeferência mundial em áreas como educação e saúde, sofre com a escassez de
utensilio básicos em decorrência da dificuldade de desenvolver sua economia,
diante da impossibilidade de manter relações comerciais e financeiras com o o
país vizinho, que é a maior potência econômica do planeta.
Foi sobre a possível manutenção
do bloqueio, do seu endurecimento que vem ocorrendo na atual gestão americana e
sobre o atual momento político cubano, que inclui a discussão de um novo texto
constitucional, que o embaixador Ronando Antonio Gomez Gonzales nos recebeu na
embaixada cubana. Para uma breve conversa:
Em breve, a ONU discutirá novamente
o fim do embargo econômico a Cuba, imposto desde 1962 pelos Estados Unidos.
Após 56 anos de política restritiva, como estão atualmente as relações entre os
EUA e Cuba, em relação ao bloqueio?
Embaixador: primeiramente, o que
podemos dizer é que há uma tentativa de se ocultar o endurecimento promovido
pelo atual governo americano dessa política genocida contra o povo cubano.
Existe um agravamento dos embargos em diversas áreas, como ter imposto ainda
mais impedimentos, em novembro do ano passado, para que os norte-americanos
façam turismo na Ilha de Cuba. O bloqueio provoca enorme prejuízo no
desenvolvimento social do povo cubano e praticamente impede um crescimento
econômico da área não estatal de Cuba.
Cuba é atualmente o único país no
mundo que os Estados Unidos proíbem seus cidadãos de visitar. As exceções são
concedidas apenas aos americanos que conseguem uma licença estatal, o que tem
sido cada vez mais raro desde que Trump assumiu. Muitos avanços conseguidos na
relação bilateral durante o governo de Obama, não apenas em relação ao turismo,
mas também nas transações financeiras e comerciais, estão sendo rapidamente
desfeitos pelo governo republicano. É isso que estamos denunciando aos países
membros da ONU, para que haja uma conscientização internacional da situação
calamitosa que vive Cuba diante de ações imperialistas e desumanas.
O bloqueio não prejudica apenas
Cuba, mas também outros países que queiram ter relações comerciais conosco e
até empresas americanas que desejam se instalar na ilha, além cidadãos
americanos que são impedidos pelo governo de viajar a Cuba.
Recentemente, a imprensa cubana estimou o prejuízo financeiro do
bloqueio em aproximadamente US$ 933,6 bilhões, ao longo dos 56 de duração. Foi
considerado também o principal freio para o Plano Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social do país. Existe um crime continuado contra os direitos
humanos do povo cubano?
Embaixador: Sim, as medidas de
austeridade são uma flagrante violação dos direitos humanos de todo um povo. É
um ato genocida, e assim se define, no âmbito do direito internacional, por ser
um Estado asfixiando uma população, intencionalmente, por meio da fome e da
escassez de insumos básicos.
Não existe no mundo uma medida
restritiva que dure tanto tempo ou que tenha causado tantos prejuízos a um
povo. O embargo é visto por Cuba como o principal entrave para o
desenvolvimento social do país e da Agenda 2030, sobre desenvolvimento
sustentável, aprovada pela ONU em 2015.
Ainda sofrendo com essa política
brutal e desumana, Cuba ainda consegue manter altos níveis em indicadores de
desenvolvimento humano e destaque em áreas importantes como mortalidade
infantil, que é uma das menores do mundo, mortalidade materna, além de educação
e saúde, que são vistos como referência no mundo todo, inclusive por países com
dimensões maiores e com produção de petróleo e outros minerais.
Mas sem dúvidas, o embargo atenta
permanentemente contra os Direitos Humanos
No ano passado, na votação da ONU, 191 dos 193 países votaram pelo fim
do embargo. Apenas Estados Unidos e Israel se manifestaram pela manutenção. O
que permite aos EUA insistir nessa política com uma reprovação global tão
esmagadora?
Embaixador: Os Estados unidos
estão ficando isolados em relação à comunidade internacional em relação a esse
assunto. A despeito de sua importância na geopolítica, nem mesmo aliados fiéis
têm endossado a medida genocida.
Infelizmente os americanos
parecem não se importar em agir de forma unilateral e imperativa, ignorando por
completo os demais países. Esse ano Washington está fazendo campanha junto a
aliados para tentar obter uma reprovação menor na votação da resolução,
motivação pela qual, Cuba também tem procurado conversar com os países para
demostrar seu descontentamento com essa situação desumana.
Cuba está passando por um importante momento histórico com a discussão
comunitária do novo texto constitucional e com um presidente que tomou posse
recentemente, Mario Díaz-Canel. Cuba conta com a redução das austeridades face
a esse novo momento?
Embaixador: Cuba deseja, porque
nosso povo necessita. O povo cubano é vítima da situação e é claro que quer o
seu encerramento. A população não pode ser penalizada por seus ideais de sociedade,
de igualdade e de solidariedade.
Nossa constituição que está sendo
debatida é o texto que nosso povo quer e totalmente compatível com o modelo de
vida cubana, baseado, sobretudo na isonomia. Então o que podemos dizer é que o
povo cubano deseja e precisa do fim dos embargos americanos.
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