Em pleno sábado de carnaval, um cartaz na entrada da maior
favela brasileira, a Rocinha, chamou a atenção no epicentro da farra momesca:
"STF se prender Lula o morro vai descer". Em meio a desfiles de
escolas de samba e bloquinhos de carnaval, o aviso poderia passar
desapercebido, se não fosse a seriedade com que os "donos do morro"
têm imposto suas regras, quase sempre pré-anunciadas em cartazes como este.
Nesse caso de apatia letárgica dos movimentos sociais, sindicais e estudantis
diante de cada etapa do golpe, parece justo que os próprios excluídos do
sistema ocupem espaços e cobrem, à sua maneira, justiça social – e jurídica. O
que não falta nos morros cariocas – e nas favelas em todo o Brasil – é
injustiça social e fuzis, os principais ingredientes de uma revolução.
A ideia de uma revolução iniciada nos morros cariocas não é
nova. Há mais de 20 anos, o mestre do samba, Wilson das Neves, já cantava em
sua obra "O Dia Em Que o Morro Descer e Não For Carnaval" a
possibilidade de haver uma ruptura social, puxada por uma minoria ignorada pelo
sistema, acima dos morros e abaixo das leis. Em um trecho do samba podemos
ouvir: "O dia em que o morro descer e não for carnaval / ninguém vai ficar
pra assistir o desfile final / na entrada rajada de fogos pra quem nunca viu /
vai ser de escopeta, metralha, granada e fuzil (é a guerra civil)". O
próprio Karl Marx já anunciara, na época da edição do Manifesto Comunista, que
a luta de classes é história de todas as sociedades. Particularmente, não
consigo vislumbrar fotografia mais precisa para a desigualdade social e a luta
de classes, que uma cidade que divide por poucos metros a soberba dos
capitalistas em edificações faraônicas, e as favelas, com população muito mais
que miserável à margem do Estado.
Ainda não se sabe quais serão as reações provocadas pela
iminente prisão de Lula, mas já sabemos as suas consequências. O ex-Presidente
é líder absoluto nas pesquisas eleitorais e a tendência, em condições de
normalidade democrática – das quais não gozamos ultimamente, apontaria para uma
vitória em primeiro turno. Cabo eleitoral, Lula colocaria qualquer nome no
segundo turno da disputa. Mas esse julgamento, que atropelou o devido processo
legal, quer prendê-lo imediatamente, para que Lula não possa sequer atuar como
cabo eleitoral. O objetivo é calar Lula, que, preso, não poderia mais falar.
Mas nem mesmo um mandado de prisão pode calar o povo.
O golpe em curso, em que o Brasil se encontra, já permitiu a
volta do trabalho escravo, acabou com os direitos históricos dos trabalhadores,
tornou os pobres mais pobres e os ricos mais ricos. Afinal o número de
milionários cresceu 11 por cento em 2016 e deve crescer até 81 por cento até
2022, segundo dados do Banco Mundial. Essa é uma projeção sem esquerda, sem
Lula, sem Luta. Se pálida classe média permanece em seus sofás esperando a
justiça vir das instituições, juntamente com os movimentos sociais, não temos
motivos para desacreditar nas palavras da Rocinha. Agora é Morro x Moro.
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