Infeliz a nação que precisa de heróis. A frase imortalizada pelo
dramaturgo alemão Bertold Brecht em 1938 não poderia descrever melhor o astral
do Brasil pós-golpe. A direita brasileira precisou fabricar corajosos paladinos
da moralidade para expurgar do poder o partido que insistia em vencer nas
urnas. No entanto, no mundo real, o tempo é suficiente para transformar em
vilões os heróis de outrora.
Aécio Neves, o “salvador da pátria” da revista Veja, sucumbiu penosamente
às duras denúncias de corrupção após ser flagrado pedindo grana ao
empresário Joesley Batista. O “malvado favorito” do golpe contra Dilma, Eduardo
Cunha, até onde se sabe, está preso. E até o “Super Moro” parece ter encontrado
no depoimento de Tacla Durán sua criptonita. Não se fazem mais heróis como
antigamente.
A mídia e o mercado pediram e a classe média atendeu. Logo após as eleições,
era necessário bater panelas contra uma presidenta eleita democraticamente.
Dilma Rousseff foi impedida de governar e os trâmites do golpe iniciaram,
enquanto o povo sentia o gosto de sangue na boca. Mas, se o antagonista desse
drama já estava sendo –injustamente– escorraçado, era necessário eleger um
protagonista. Um nome forte, com ares incorruptíveis e em quem a população
confiasse cegamente e sem jamais questionar.
Após algumas tentativas frustradas, o nome de Sérgio Moro caiu como uma
luva. Foi então que o juiz curitibano passou a ser representado nas
manifestações em bonecos infláveis vestido de super-herói. Mesmo após o
impeachment e a queda de seus “rivais”, Moro continuou sendo representado com
capa e superpoderes em manifestações convocadas pelo MBL e outros grupelhos
fascisto-paneleiros. Já Lula era representado no boneco pixuleco, pintado como
um presidiário. A luta do bem contra o mal estava armada.
A via crucis foi montada e o “herói” condenou Lula, sem provas, baseado
apenas em delações. Mas, como Aquiles e seu calcanhar, Moro tinha um ponto
fraco, as próprias delações premiadas. Apesar de a mídia comercial esconder a
todo custo o depoimento de Tacla Durán na CPI da JBS esta semana, a afirmação
do ex-advogado da Odebrecht de que as delações foram manipuladas inegavelmente
enfraqueceu a narrativa da Lava-Jato. Durán, que trabalhou na empreiteira entre
2011 e 2016, acusa o advogado Carlos Zucolloto (padrinho de casamento de Moro)
de pedir 5 milhões de dólares para “facilitar” sua delação.
O depoimento comprova o que todo mundo desconfiava: o instituto da
delação premiada, como tudo no Brasil atualmente, virou uma indústria com os
fins de aniquilar o PT. Durán detalhou como o esquema funcionava: “Recebi uma
minuta do Ministério Público (sobre o acordo de delação) que
constava que o valor seria reduzido para um terço, mas que eu pagasse os 5
milhões de dólares para uma conta de Andorra”.
A acusação é grave, ainda mais quando se sabe que, em vez de provas
concretas, a operação Lava-Jato se baseou principalmente no instituto da
delação premiada. Muitas vezes questionado, o método destituiu deputados,
senadores e enviou alguns políticos para a cadeia (caso não fossem do PSDB,
claro). Uma denúncia como essas deveria fazer a própria operação desmoronar e
seus argumentos caírem por terra. Moro, como juiz titular e líder supremo
da República de Curitiba, perde o posto de sentinela da probidade. Se
estivéssemos em um país sério, sua atuação deveria ser investigada.
Só nos resta questionar quem serão os novos heróis anti-PT e anti-Lula
que vão aparecer no cenário até 2018. Mas uma coisa é certa: um dia a máscara
cai.
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