Por
Pedro Tierra*
“Do
ventre fecundo das filhas do povo,
das
cinzas dos ranchos, da terra queimada, das marchas, das greves, das ruas
feridas, nascerão seus julgadores.”
Independente
do resultado da farsa que se monta em Porto Alegre, neste 24 de janeiro de
2018, as esquerdas brasileiras devem se preparar – na perspectiva de uma
resistência de longo prazo – para jornadas de desobediência civil contra um
Judiciário que se arvora em poder tutelar sobre os demais poderes e sobre a
sociedade.
O que ocorrerá ali? Porto Alegre será cenário
de um teatro de sombras supostamente judicial. O TRF 4 examinará o recurso
contra a sentença do juiz de primeira instância que proferiu a condenação de um
ex-presidente da República, ignorando a acusação inicial apresentada pelo
Ministério Público. No final do processo, ao exarar a sentença, formulou outra denúncia
a partir de um inédito “ato de ofício indeterminado”, ou seja, sem prova
material. Num único gesto, o juiz expôs a incompetência do Ministério Público
para comprovar a denúncia que apresentou e assumiu para si a atribuição de
acusador. O que seria suficiente num país com menor vocação para o circo, para
anular o processo.
Esse processo expôs a fragilidade de uma
importante instituição do Estado Democrático de Direito moderno, o Ministério
Público Federal, capturado por um estamento privilegiado, regiamente pago, que
se põe frequentemente a serviço de seus próprios interesses corporativos em lugar de defender a sociedade,
como define a Carta de 88. O plano inclinado em que resvalaram os procuradores
que atuam no processo para impedir a candidatura de Lula à Presidente,
liderados pelas convicções de Dallagnol – uma espécie de Bolsonaro envernizado
– indica a necessidade de debater a sério a partidarização do Ministério
Público e o controle social de suas funções.
Aos poucos vai se desenhando, neste país
surreal, uma inversão surpreendente: o acusado e sentenciado sem provas materiais
– não há prova porque não há crime – ergue um espelho diante dos olhos do país
e do mundo onde se reflete a imagem obscena do Poder Judiciário brasileiro despido
de sua toga, e exposto em sua lamentável e mesquinha verdade: mero instrumento nas
mãos dos herdeiros dos senhores de escravos, constituídos numa plutocracia que não
hesita em violar o Estado Democrático de
Direito quando ele se revela disfuncional na defesa dos seus privilégios de
classe.
A hipertrofia do Judiciário brasileiro põe em
cheque as bases de sustentação do sistema democrático estabelecido pela Carta
de 1988: a soberania popular e o equilíbrio entre os poderes. Ao chancelar e
conduzir formalmente o processo que resultou no impedimento da Presidente
eleita Dilma Rousseff, sem crime de responsabilidade, o Judiciário se tornou
cúmplice de um golpe de estado que violou a vontade das urnas, portanto, violou
a soberania popular; ao invadir repetidas vezes as atribuições do Legislativo e
do Executivo – por exemplo a nomeação de Ministros pelo titular da Presidência
da República –, o Judiciário brasileiro
destruiu o equilíbrio entre as instituições que dirigem o país e submeteu ao
seu critério precisamente os poderes cuja origem e legitimidade derivam do voto
popular.
Cabe perguntar: quem nomearia os Ministros do
Presidente Lula, se vier a vencer o cerco e a caçada que lhe move o Judiciário
brasileiro, e ainda assim for eleito? O Gilmar Mendes? A firmeza e a tenacidade
do mais importante líder popular que as lutas dos trabalhadores produziram
acabou por engendrar uma situação pouco usual, aqui e em outras latitudes:
Lula, o réu, arrasta consigo para o cadafalso que armaram em Porto Alegre, o
próprio Judiciário que o julga.
Há um desafio posto para as esquerdas
brasileiras, para encarar um novo momento das lutas de classes que se abriu com
o golpe de 2016. Incluir em suas táticas de resistência, num país onde a
cultura herdada da escravidão não permite questionar um Juiz, ainda que ele se
apresente empunhando um fuzil apontado para o espectador da foto, jornadas de
desobediência civil.
O filho de Canudos resistiu ao massacre e será
conduzido a Porto Alegre. Não irá acorrentado como desejariam alguns. Ele
encarna milhões. 120 anos depois, neste país que desafia a compreensão e a
lógica, os filhos de Canudos renasceram e se multiplicaram para nos repetir, utilizando
a palavra majestosa de Euclides da Cunha: “Canudos
não se rendeu. Exemplo único na História, resistiu até o esgotamento completo.
Expugnando palmo a palmo na precisão integral do termo, caiu no dia 5 ao
entardecer quando caíram seus últimos defensores, que todos morreram. Eram
quatro apenas: um velho, dois homens feitos e uma criança na frente dos quais
rugiam, raivosamente cinco mil soldados”.
O aparato montado pelas forças repressivas
para impedir o direito de livre manifestação popular, não será suficiente para
apagar a presenças dos herdeiros de Canudos.
Depois de 25 de janeiro: Caravanas.
*Pedro Tierra é poeta.
Ex-presidente da Fundação Perseu Abramo.
Caro Pedro, Antonio Conselheiro tinha um exército do tamanho de Canudos. O exército de Lula ultrapassa fronteiras. É do tamanho dos sonhos dos brasileiros do bem, de norte a sul do Brasil, é do tamanho dos sonhos dos que, assim como você, vão a luta por um país justo, com distribuição de renda e com opção pelos menos favorecidos. Se eu votaria em alguém condenado pela justiça? No caso específico do companheiro Lula, SIM. SIM PARA LULA, SIM PARA MANDELA, SIM PARA GANDHI, SIM PARA GUEVARA E MUITOS OUTROS Injustiçados e perseguidos por uma elitezinha mesquinha e mal acostumada com um estado que sempre lhes foi tomado como sua Casa Grande. VIVA LULA.
ResponderExcluirJOSIAS