Os terraplanistas, aquele grupo bizarro que acredita que a
Terra é plana, e o MBL, aquele grupo que defende a reforma trabalhista sem
nunca ter trabalhado, têm muitas coisas em comum. Ambos propagam ideias
medievais, desafiam a lógica e, por incrível que pareça, possuem um crescente
número de seguidores nas redes sociais. Mas existe uma outra semelhança
peculiar: os dois movimentos costumam usar o termo “globalista” para, por
motivos diferentes, denominar seus contraditores. Enquanto que para os
terraplanistas o termo remete ao grupo que “insiste em acreditar” que a Terra
possui formato esférico, para a turma de Kim Kataguiri, globalista se refere à
agenda da Rede Globo –para eles, uma emissora comunista. Difícil eleger quem
está mais fora de órbita.
Apontar as Organizações Globo como um símbolo de esquerda é
um sintoma do delírio conservador do MBL. A bem da verdade, o conglomerado dos
irmãos Marinho é a perfeita antítese do comunismo e da esquerda: uma
megacorporação capitalista, que construiu seu império graças à ajuda dos
militares, cuja ditadura apoiou desde a primeira hora, e que representa, em
tempo integral, os maiores detentores de capital do país –seus anunciantes, por
sinal. Ao tentar criar esse tipo de factoide, o MBL desinforma os milhões de
seguidores, atraindo-os para um campo ainda mais conservador, com um discurso
sem o menor compromisso com a realidade. Como se não bastassem as fake news que
dissemina nas redes sociais…
Essa narrativa nonsense e aparentemente pontual começou
quando o grupelho comemorou o fim do Esquenta, dominical apresentado por Regina
Casé, para eles um programa de “extrema-esquerda”, no final do ano passado.
Tamanha sandice passaria despercebida, mas a alcunha de esquerdista da “agenda
globalista” da emissora virou assunto frequente a partir daí. A Globo foi
tachada de comunista por não se alinhar ao grupo em temas como a absurda
censura da exposição QueerMuseu no Santander Cultural, em Porto Alegre, e o
estatuto do desarmamento. Os ataques se intensificaram quando os emebeelistas
temeram a pré-candidatura de Luciano Huck, que parecia ameaçar os planos de
seus candidatos favoritos, João Doria entre eles.
Mas MBL e Globo nem sempre ficaram de lados opostos. Como se
pode imaginar, duas instituições conservadoras, de direita e protagonistas no
processo injusto de destituição de Dilma Rousseff militaram juntos em temas
como a “reforma” trabalhista e a PEC do teto dos gastos. Nesses casos, a
emissora deixou de ser “comunista” na hora; afinal, na maioria das vezes,
criticar a postura da Globo é fazer uma crítica indireta à própria ideologia
política, atirar no próprio pé. Em 2017 o MBL mentiu, manipulou, censurou e
difundiu o ultraconservadorismo cada vez mais presente na nossa sociedade. A
Globo também não foi por um caminho muito diferente: seguiu sua vocação
direitista e conservadora ao apoiar pautas elitistas e plutocratas, além de
encobertar corruptos aliados, sobretudo os tucanos.
A Globo da foice e do martelo só existe nos devaneios febris
do MBL, tão distante da realidade quanto o geocentrismo. Mas, na disputa sobre
quem é mais aloprado, pelo menos nos terraplanistas o delírio não é movido a
canalhice.
Nenhum comentário:
Postar um comentário